236: Terapêutico 236: Terapêutico ** Eli **
Obviamente, aquela conversa não terminou do jeito que seu pai queria, e o velho estava positivamente espumando de raiva quando Eli bateu a porta ao sair do cômodo.
Mas isso não importava. Deixe o controlador manipulador pensar o que quiser e fazer o que quiser. Miracles já tinha conseguido o contrato e o financiamento para o projeto de VR, então não havia mais nada que Eli pudesse ser ameaçado naquele ponto. Ser demitido? Sem problemas. Ser deserdado? Perfeito. Talvez ele até aproveitasse a oportunidade para fazer um espetáculo memorável na gala de verão antes de desaparecer de vez do círculo financeiro da cidade.
O pensamento sombrio pairou sobre sua mente pelo resto do dia, tornando seu humor suficientemente sarcástico para que mais de um punhado de funcionários azarados fossem brutalmente trucidados durante suas apresentações na reunião. Nem mesmo a volta para casa no fim do dia aliviava aquela carranca sombria… se não fosse pela visão de Harper parada no meio da sua cozinha, vestindo o avental dele e ocupada com a tábua de cortar.
“Oh, você voltou cedo!” ela exclamou, acenando com a faca na mão para ele antes de se lembrar e baixá-la às pressas. “Ou talvez eu tenha demorado muito… Eu esperava ter esse casserole pronto quando você voltasse, mas ainda nem chegou na metade.”
Eli olhou para a bagunça da cozinha transbordando de legumes cortados de qualquer jeito, carne mal descongelada e uma tigela de arroz excessivamente encharcado que parecia um pudim pegajoso…
Um sorriso levantou o canto de seus lábios que tinha ficado para baixo quase o dia todo. E assim, todo o último vestígio de aborrecimentos remanescentes desapareceu de sua cabeça.
Essa garota deve ser um anjo, para conseguir fazer uma cozinha caoticamente desesperançosa parecer tão doce e terapêutica.
“Então foi por isso que você não me deixou te buscar no trabalho hoje?” Ele tirou o paletó do terno, arregaçou as mangas e juntou-se ao seu anjo no meio daquele campo de batalha caótico com um beijo.
Ele não esqueceu de pegar a faca da mão dela e colocá-la de lado primeiro, é claro.
“Mm-hmm. Eu pensei que devia comemorar o primeiro dia da minha mudança oficial com algo especial, e você já me mostrou essa receita da última vez, então…” Harper olhou para a cena que ela tinha criado em volta dela. “Bem, eu suponho que não esperava que desse tanto trabalho. Você fez parecer tão fácil quando fez.”
Eli derreteu numa poça ao ouvir aquelas palavras. A garota que só sabia ferver macarrão um mês atrás agora estava tentando fazer um jantar gourmet completo para ele. Porque ela estava “oficialmente se mudando”. Ele não conseguia decidir qual parte disso ele amava mais… ou talvez ele apenas amasse tudo o que esse anjo parado na frente dele fazia e dizia.
“Vou te ajudar.” Ele virou-se para a pia para lavar as mãos. “A culpa é minha por não ter detalhado os passos. O arroz, por exemplo, funciona melhor em casseroles se for de grão longo. Como jasmim ou basmati. Fica mais fofo desse jeito e se mistura bem com a carne e o molho.”
“Oh…” Harper mordeu o lábio. “Droga. Eu usei o arroz de risoto.”
Sim. E também água demais.
“Ainda vai ficar bom, não se preocupe. Não há mal em adicionar um toque único aos clássicos.” Eli guardou as críticas para si. Ele teria que fazer um trabalho complicado para salvar aquele arroz pegajoso de pudim. “Da próxima vez, eu vou devagar e te mostro todas as dicas novamente desde o início.”
O olhar abatido da garota pareceu se iluminar um pouco com o seu encorajamento. “Vou anotar,” ela prometeu. Depois mordeu o lábio novamente, com uma expressão completamente diferente desta vez. “E… você sabe que eu gosto de ir devagar. Sempre que você quiser.”
… Certo. E agora seu anjo estava se transformando em sua pequena diabinha mais uma vez.
Eli deu-lhe um olhar demorado que prometia negócios inacabados sobre aquele assunto. Ela riu enquanto ele voltava para os legumes, retomando o trabalho de corte que ela tinha deixado pela metade.
“Então… Como foi seu dia?” ela perguntou depois de observá-lo em silêncio por um momento. “Você parece que teve um dia ruim. Você não precisa ajudar aqui, sabe. Eu posso terminar o resto enquanto você descansa um pouco no sofá.”
O corte pausou. Eli olhou para ela, surpreso. “É tão óbvio assim?”
Ele esperava que não tivesse levado a carranca do trabalho para casa para ela ver. Especialmente não quando seu humor já havia melhorado 180 graus tão logo ele a viu.
“Seus ombros estão tensos.” Harper colocou a mão suavemente em suas costas. “E você não está cortando com a precisão de sempre. Parece que algo está te incomodando… ou estava, e te deixou tenso o dia todo.”
… Às vezes era assustador o quão observadora essa garota era. Ou o quanto ela o conhecia bem o suficiente para pegar cada pequeno indício assim.
“É, eu tive uma conversa infeliz com aquele filho da puta do meu pai.” Eli tentou manter um tom casual. “Nada sério saiu disso, mas com certeza foi um estraga-prazeres.”
Harper piscou, provavelmente sem certeza se deveria reagir com um suspiro de compaixão ou um riso pelo título que já carregava muitas referências a esse ponto.
“Aff,” ela se decidiu a dizer. “Parece mesmo a definição de um dia difícil… Por que você não vem descansar um pouco comigo? O casserole pode esperar — duvido que vá ficar pior se deixarmos os ingredientes por aí, já que eu já estraguei o suficiente de qualquer forma.”
Ela desamarrou o avental na cintura e pegou a faca da mão dele, colocando-a no balcão. De modo gentil mas inegociável, pegou sua mão e o puxou em direção ao sofá.
… Garota mandona. Do jeito que ele adorava.