- Home
- O Demônio Amaldiçoado
- Capítulo 817 - 817 Lacrado com Culpa 817 Lacrado com Culpa No dia seguinte o
817: Lacrado com Culpa 817: Lacrado com Culpa No dia seguinte, o sol carmesim nasceu sobre o horizonte, lançando um brilho sangrento sobre a terra.
Rowena estava na grande varanda, sua figura esbelta ainda que curvilínea banhada na luz da manhã inquietante, a brisa suave levantando as mechas escuras de seu cabelo.
Sua mão instintivamente descansava sobre a leve saliência de sua barriga, sentindo o pulso fraco da vida crescendo dentro dela. Era estranho—irreal, até.
Esta criança…
Um milagre.
Levou alguns momentos para acreditar no que todos lhe disseram depois que ela acordou.
Apesar de tudo que ela perdeu, apesar das cinzas de seu reino, apesar da dor que persistia como uma ferida que nunca se fecharia—
Este bebê estava vivo.
Uma menina saudável, especial e forte.
Algo puro, algo intocado pela guerra, traição ou derramamento de sangue.
Pela primeira vez em uma eternidade, ela sentiu algo que pensou ter perdido—
Um vislumbre de esperança.
Mas tão rapidamente quanto essa calor chegou, o rosto dele invadiu sua mente.
Asher.
Seus dedos se apertaram contra a fria balaustrada de pedra.
Ela fechou os olhos, mordendo as emoções que turbilhonavam dentro dela como uma tempestade.
Detestava que pensar neste filho sempre o trouxesse de volta a sua mente.
O homem que mentiu para ela.
O homem que matou seu pai.
O homem que ela amou tão profundamente que não conseguiu matá-lo.
Em vez disso, ela o baniu.
Mas por quê?
Por que seu coração ainda doía quando pensava nele?
Por que ela ainda sentia que uma parte dela havia sido arrancada no momento em que ele partiu?
Seus pensamentos foram interrompidos pelo som suave de passos se aproximando.
Ela não precisava se virar para saber quem era.
Isola.
Rowena soltou um suspiro silencioso, compondo-se enquanto a jovem mulher pisava na varanda ao lado dela.
Por um momento, nenhuma delas falou.
Elas simplesmente ficaram lá, observando o sol nascente, banhadas pelo seu brilho carmesim.
E então, finalmente—
Rowena falou.
“…Desculpa.”
Isola virou a cabeça, seus olhos azul-safira se arregalando levemente. “Por
quê?”
Os olhos carmesins de Rowena baixaram, seus dedos se apertando ligeiramente contra a balaustrada de pedra.
“Sua mãe… Eu não consegui salvá-la.”
Uma sombra atravessou as feições de Isola, mas em vez de tristeza, havia compreensão.
Ela balançou a cabeça, sua voz suave ainda que com um toque de tristeza, “Não há nada pelo que você deva se desculpar.”
Rowena apertou seus lábios, “Ela morreu para me deixar escapar. Ela—”
“Ela morreu protegendo nosso futuro,” Isola interrompeu gentilmente, colocando a mão sobre a de Rowena. “E se ela estivesse aqui, ela não iria querer que você se culpasse. Minha mãe… ela sempre estava pronta para fazer sacrifícios pelas pessoas que amava.”
A garganta de Rowena apertou. Ela podia ver a dor velada nos olhos de Isola e como ela tentava parecer normal pelo bem dela.
Ela sempre soube que Narissara era uma rainha forte e orgulhosa.
Mas dar a vida tão altruistamente apesar da história que compartilhavam…
Por eles…
Por ela…
Isola deu um pequeno sorriso triste, “Se for o caso, eu deveria ser a agradecer a você.”
Rowena piscou, sua expressão ligeiramente confusa.
“Agradecer? A mim?”
Isola assentiu. “Você arriscou tudo para salvar minha vida. Eu feri seus sentimentos e fiz você se sentir traída. Mas… você veio por mim…”
Os dedos de Rowena tremeram levemente, “Não importa o que eu estava sentindo… Eu sabia que não poderia perder você.”
“Eu também não quero perder você,” Isola disse calorosamente. “É por isso que sou grata. E…”
Sua voz falhou por um segundo antes de ela respirar fundo, sua expressão se tornando pesada.
“…E eu lamento.”
Rowena apertou os lábios enquanto Isola adicionava, “Por manter o passado de Asher em segredo de você.”
O corpo inteiro de Rowena ficou rígido.
Isola percebeu, mas ela continuou, “Eu sei que deveria ter lhe contado. Mas eu… Eu estava esperando que ele mesmo falasse. Ele planejava fazer isso depois da guerra. Ele nunca esperava que você descobrisse antes.”
Os dedos de Rowena se fecharam em um punho apertado.
Ela se virou, o sol nascente já não era caloroso mas zombeteiro.
Asher teve tantas chances de contar a ela.
Tantos momentos em que ele poderia ter dito a verdade.
E ainda, ele escolheu mantê-la no escuro—
Até que era tarde demais.
“…Ele matou meu pai,” Rowena finalmente disse, sua voz oca, e acrescentou,
“Mesmo que ele tivesse que fazê-lo por causa da missão… Eu não posso esquecer que foi por causa dele.”
Isola baixou o olhar.
Ela não tinha desculpas. Nenhuma justificação.
Os olhos carmesins de Rowena se estreitaram, “O que eu sou suposta a fazer com tudo isso?” Rowena sentia-se ainda mais perturbada, especialmente ao pensar na criança crescendo em seu ventre.
Isola encontrou o olhar dela, firme e inabalável.
“Eu não posso te dizer o que fazer, mas por enquanto, talvez ler isto possa te ajudar a saber o que fazer—” ela lentamente retirou algo das dobras de seu vestido.
Uma carta.
Selada com cera vermelha escura.
Os olhos de Rowena brilharam com algo indecifrável enquanto Isola estendia para ela.
“Por mais que você possa odiá-lo pelo que ele fez—Ele queria que você lesse isto,” Isola disse.
Rowena fitou a carta.
Ela não estendeu a mão para pegá-la.
Ela nem mesmo se mexeu.
Ela apenas olhou.
Isola pressionou gentilmente a carta nas mãos de Rowena.
“Eu sei que você pode não querer lê-la, mas pelo menos guarde-a,” ela disse, “Mesmo que você o ressente pelo que ele fez. Mesmo que você nunca o perdoe. Por favor, leia. Você pode então entender por que ele fez o que fez.”
Os dedos de Rowena tremiam levemente enquanto fechavam em torno da carta.
Ela não sabia porque a pegou.
Ela não sabia se iria abri-la.
Mas algo dentro dela não a deixava recusá-la.
Isola deu-lhe um pequeno aceno, “Vou deixar você com ela.”
Com isso, ela virou e se afastou, deixando Rowena sozinha na varanda mais uma vez.
O ar da manhã estava parado.
O sol continuava a nascer, o céu queimando de vermelho.
Rowena olhou para baixo, para a carta agarrada em suas mãos.
Ela o odiava, mas uma parte de seu coração doía por algo.
Ela queria esquecê-lo.
E ainda assim…
Seus dedos lentamente traçaram sobre o lacre de cera vermelho escuro.
O pergaminho parecia pesado em suas mãos.
O lacre de cera ainda estava intacto, inquebrado, mas os dedos de Rowena tremiam enquanto pairavam sobre ele.
Sua mente lhe dizia para não abri-la, convencendo-a de que ela não precisava ler o que quer que ele tivesse a dizer.
E ainda—
Ela ainda estava segurando-a.
Suas mãos se moviam por conta própria.
Antes mesmo de perceber—
Ela quebrou o lacre.
O leve aroma dele permanecia no pergaminho. Um cheiro que ela tinha tentado tanto esquecer.
Então, com uma respiração profunda, ela desdobrou a carta.
——
[ Rona,
Não sei se você vai ler isto. Não sei se você vai queimá-la assim que vir meu nome. Talvez você a rasgue como eu rasguei seu coração sem querer. Mas se você está lendo isto… então suponho que ainda há uma parte de você que não me odeia completamente. Ou talvez você só queira ver que tipo de desculpas eu tenho a dar. Eu não te culparia por isso. ]
Os dedos de Rowena apertaram na carta.
Ela tinha querido odiá-lo.
Ela ainda o fazia.
Mas por que o peso de suas palavras parecia uma âncora puxando-a para baixo?
Ela continuou lendo.
[ Você não me deve nada. Menos ainda perdão. Se eu estivesse no seu lugar, nunca teria deixado eu viver. Sei como é ser traído… eu experimentei isso mais uma vez, fazendo-me perceber o quão merda eu sou como homem. Eu me aproveitei dos seus sentimentos e confiança para me proteger, mesmo que nunca tivesse a intenção de fazê-la sentir-se traída.
Não mereço a bondade que você me mostrou, me deixando ir e até me impedindo de interferir na guerra. Mas Rona, há coisas que preciso te contar… coisas que eu deveria ter dito antes que fosse tarde demais. E talvez eu nunca tenha a chance de lhe dizer pessoalmente. Então vou contar aqui, uma por uma. Se você ainda quiser lê-las.
A verdade é… Eu fui forçado a me tornar um mentiroso após acordar como um demônio. Uma nova vida que nunca esperei ou estava preparado para viver. ]
Rowena inalou abruptamente.
[ Eu não queria me tornar um mentiroso. Mas porque mentir era a única coisa que me mantinha vivo por tanto tempo quanto consigo me lembrar. Aprendi da maneira mais difícil na minha vida passada que no momento em que eu dissesse a verdade, no momento em que eu baixasse a guarda, tudo o que eu me importava era tirado de mim.
Então eu não queria repetir esses mesmos erros que acabaram comigo sendo apunhalado pelas costas pelos mesmos humanos com quem lutei e uma vez estimei. Naquela época, eu senti que todo o meu mundo estava desmoronando sobre mim… sei que você deve ter sentido algo semelhante quando descobriu essas coisas sobre mim. ]
Rowena podia sentir algo dentro dela torcer.
As chamas de raiva que ela carregava por ele—ela queria que elas queimassem mais quentes, para consumir tudo, para reduzir estas palavras a cinzas.
E ainda assim…
Havia uma tristeza em suas palavras.
Algo cru.
Algo que a fez segurar a carta ainda mais forte.
Ela não fazia ideia de que ele foi traído assim. Ela pensou que os humanos inventaram alguma história para levar o crédito por matar seu pai e não se surpreendeu ao ver que eles pareciam não se importar com o legado do Príncipe Dourado.
Mas ela nunca esperou que esta fosse a verdadeira razão.
[ Como um demônio, tornou-se um hábito—não, uma necessidade esconder meus verdadeiros pensamentos para me proteger e um dia vingar-me daqueles que me traíram. Eu acreditava que esta vida era uma segunda chance para mim fazer isso.
É verdade que eu pretendi fazer você se apaixonar por mim para tirar vantagem do seu poder para obter minha vingança. ]
Rowena apertou os lábios.
[ Eu não senti nenhum arrependimento ou remorso naquela época porque eu odiava demônios mais do que qualquer coisa. Era um ódio que eu carregava desde criança. Mas eu era ignorante. ]
Eu nunca entendi que demônios eram pessoas que podiam amar e proteger também, em vez de apenas matar. E que demônios como você foram forçados a uma vida assim pela sobrevivência. Não que todos vocês sejam naturalmente maus.
Só vivendo como um e te conhecendo eu comecei a perceber isso lentamente.
Você me ajudou a perceber isso e naquela época… eu já tinha me apaixonado por você. ]
Rowena sentiu algo puxando em seu coração.
[ Eu não menti para você porque eu queria machucá-la. Eu menti porque eu estava com medo. Com medo de perdê-la. Com medo que, se você soubesse quem eu realmente era, o que eu tinha feito, você olharia para mim da maneira que fez naquele dia. Como se eu fosse um monstro.
E eu era. Talvez ainda seja.
Se ao menos eu pudesse voltar no tempo, eu teria certeza de nunca machucá-la nem um pouco.
Mas eu não posso…
É por isso que você precisa saber disto, Rona. Eu nunca menti sobre amar você. Eu sei que você pode não ser capaz de confiar no que estou dizendo, mas não tenho mais razão para mentir. Eu vou fazer o que for preciso para fazer você acreditar em mim. ]
Ela conteve a respiração.
Sua visão turvou.
Por quê…
Mesmo agora, quando ela queria odiá-lo o máximo—
Mesmo agora, as palavras dele a alcançaram.
[ Eu não espero que você me perdoe. Mas continuarei enviando estas cartas enquanto estiver preso aqui, tentando recuperar tudo o que perdemos. Você pode jogá-las fora se quiser.
Se você não receber outra carta minha… então significa que eu falhei. Falhei com você e com nosso povo. Mas mesmo que isso signifique passar pelas profundezas dos Sete Infernos, eu vou garantir que não falharei com todos vocês novamente.
Eu vou te amar até o final dos meus dias.
Mesmo que você nunca me ame novamente. ]
—–
Suas mãos tremiam enquanto ela baixava lentamente a carta.
Seu coração batia em seu peito, emoções colidindo como uma tempestade interminável dentro dela.
Ela queria esquecer a carta.
Fingir que ela nunca existiu ou que ela a leu.
Mas ela não podia.
Seus dedos roçavam pelo pergaminho, traçando as indentações de suas palavras.
Palavras escritas por suas mãos.
Palavras destinadas apenas a ela.
Seus lábios se entreabriram, mas nenhuma palavra saiu.
Uma profunda e dolorosa vazio se instalou dentro dela.
Ela não estava pronta para perdoá-lo.
No entanto, ela dobrou a carta e a guardou na gaveta ao lado de sua cama antes de se afastar com passos pesados.