Escravo das Sombras - Capítulo 1934

Capítulo 1934: Primeira Classe

As torres na parede maciça ainda estavam sendo calibradas por um exército de técnicos, mas a Academia já estava recebendo sua primeira leva de jovens Sonhadores. Tão tarde no ano, havia um número considerável deles — quase quinhentos.

Alguns haviam vindo daqui do CNQN, alguns haviam chegado de outras cidades no Quadrante Norte. Muitos haviam sido trazidos através dos oceanos em comboios navais fortemente blindados — não só da África, Antártica e Austrália, mas também das Américas. Era um claro sinal de como o governo estava levando a sério o estabelecimento da Academia.

Havia muitos convidados ilustres, também. Orum era um deles, observando a cerimônia silenciosamente. Jest não tinha aparecido, o que provavelmente era o melhor, mas ele viu muitas caras familiares.

O Guardião do Valor de fato fez um discurso… e foi de fato um pouco chato. Filtrando a voz austera daquele homem, Orum olhou para os jovens Sonhadores.

Eles já haviam se saído bem para sobreviver ao Primeiro Pesadelo. Na verdade, havia muito mais sobreviventes este ano do que nunca antes. Muito provavelmente porque as crianças infectadas pelo Feitiço neste ano tinham todas nascido após sua descida e cresceram em suas garras implacáveis. Eles eram de uma espécie diferente.

Honestamente, Orum às vezes se sentia assustado pela nova geração.

De qualquer forma, havia outra prova esperando por eles agora. O solstício de inverno não estava tão longe, e em breve, eles seriam enviados ao Reino dos Sonhos. Quantos ficariam vivos? Ele esperava que todos eles, mas é claro, seu desejo não estava destinado a se tornar realidade.

Pelo menos o impressionante elenco de instrutores empregados pela Academia seria capaz de prepará-los melhor para a jornada. Naturalmente, esses instrutores não eram Despertos do mais alto calibre, mas eram competentes o suficiente para ganhar sua confiança.

Ele reconheceu alguns dos Adormecidos, também.

O jovem alto com uma expressão fria era Bigorna, filho do Velho Valor. Ele transmitia uma impressão inacessível e era facilmente notável por sua postura e compostura impecáveis. Seu cabelo escuro estava cortado de forma limpa, e seu olhar era afiado… ao contrário da maioria dos Adormecidos, que pareciam traumatizados por seus Pesadelos e assustados com o solstício, ele estava calmo e sereno.

Como se tivesse nascido para carregar o Feitiço do Pesadelo.

O filho mais novo de Valor não era o centro das atenções, no entanto. Em vez disso, era uma bela jovem mulher parada ao lado dele, com um sorriso fácil nos lábios. Ela era como um raio de sol na atmosfera soturna do salão subterrâneo, atraindo muitos olhares furtivos de outros jovens.

Ela era Sorriso do Céu, filha da Chama Imortal… e já uma pioneira, assim como seu pai. Afinal, ela foi a primeira humana a ter conquistado um Nome Verdadeiro no Primeiro Pesadelo. Seu futuro era, sem dúvida, brilhante.

Orum lembrava vagamente de ter visto esses dois alguns anos atrás, quando ainda eram crianças pequenas. Agora, ambos tinham dezesseis anos e já haviam sido temperados pela crueldade do Feitiço do Pesadelo.

Para sua surpresa, porém…

Havia alguém mais que chamou sua atenção. Ele não conhecia esse jovem e não conseguia identificá-lo. O jovem homem não parecia uma criança de nenhuma das poderosas famílias que tinham surgido desde a descida do Feitiço…

Ao contrário de Bigorna e Sorriso do Céu, o jovem estava vestindo roupas baratas que estavam a caminho de se tornarem trapos. Ele tinha cabelo preto e olhos cinzentos penetrantes, seu olhar estranhamente aquecido. Havia uma qualidade de nitidez nele que apenas aqueles que presenciaram muito possuíam, mas também um toque de gentileza que era tanto cativante quanto fora de lugar.

Os instintos de Orum lhe diziam que o jovem era especial de alguma forma, mas ele não conseguia colocar o dedo no que era.

‘Ah. Eu entendo.’

Ele finalmente entendeu por que o jovem homem se destacava entre seus pares e sorriu levemente.

Era porque todos os outros estavam tentando esconder seus olhares, mas o jovem estava olhando para Sorriso do Céu descaradamente.

‘Que sujeito corajoso.’

Balançando a cabeça, Orum desviou o olhar e lançou outro olhar para o mar de rostos juvenis.

Então, ele congelou por um momento.

Havia outro rosto familiar na multidão, bastante distante do centro das atenções. Um que ele conhecia muito melhor do que o do filho de Valor ou da filha da Chama Imortal.

‘Pequena Ki…’

Uma dor surda perfurou o coração de Orum.

Ela era alguns anos mais velha que os outros dois, no limite da idade suscetível ao roubo do Feitiço do Pesadelo.

Ela quase estava segura.

Seu juvenil desajeitamento havia desaparecido, substituído por uma confiança tranquila. O toque de melancolia permanecia, no entanto.

Orum rangeu os dentes e desviou o olhar.

‘…Claro.’

Sua mãe era uma Desperta tão excepcional, afinal. Se até seus sobrinhos e sobrinhas estavam em risco, então Pequena Ki também estaria.

Ele suspirou pesadamente.

‘Está tudo bem.’

Ela era filha de Coração do Corvo. A maçã não cai longe da árvore, e sua mãe a teria preparado bem.

Pequena Ki já tinha sobrevivido ao seu Primeiro Pesadelo, provando que ela era forte o suficiente para suportar a crueldade do Feitiço do Pesadelo. Sim, seu futuro seria de derramamento de sangue e perigo, como o de todos os Despertos… mas Orum tinha vivido essa vida por um tempo, e ele estava bem.

Certamente, ela estaria bem também.

Sua mãe governava uma Cidadela no Reino dos Sonhos. Embora a família Song não fosse muito renomada, ainda era uma das famílias mais ilustres da era moderna. Pequena Ki tinha muitas vantagens para ajudá-la a sobreviver tanto no Mundo Desperto quanto no Reino dos Sonhos.

E ele tinha seus próprios problemas para lidar. Muitos deles para perder tempo com a criança de um velho conhecido…

Logo, a cerimônia acabou. Os Adormecidos foram levados para seus dormitórios pelos atendentes, e os convidados ilustres foram guiados para um salão de banquete.

Orum se encontrou no meio de uma celebração mais uma vez. No entanto, ele não tentou socializar com seus pares, ficando em um canto com uma expressão sombria.

Eventualmente, ele encontrou seu caminho até o centro do salão, onde uma pequena multidão estava reunida ao redor de uma figura exaltada.

“…Parabéns, senhor!”

“Seu filho definitivamente herdou a valentia de seu pai.”

“Como vai a luta contra a Floresta Sombria? Não visito o Bastião faz um tempo…”

Orum pacientemente fez seu caminho através do círculo de bajuladores e inclinou-se levemente.

“Guardião Ascendido.”

O homem — Guardião do Valor — olhou para ele em confusão por um momento, então sorriu levemente.

“Orum Despertado. É bom ver você novamente… como está sua Cidadela? Se aquele Demônio Caído ainda está causando problemas em seu território, posso enviar alguns dos meus cavaleiros para ajudá-lo.”

Orum sorriu educadamente.

“Obrigado, mas eu já resolvi isso. Na verdade, eu queria falar com você sobre outra coisa…”

O sorriso do Guardião se iluminou um pouco, e ele deu um tapinha no ombro de Orum.

“Você derrubou um Demônio Caído, Orum? Como esperado… excelente! Isso é o que um Desperto deve almejar ser.”

Ele lançou um olhar desdenhoso para as outras pessoas ao redor deles, então voltou a olhar para Orum.

“Sobre o que você queria falar?”

Orum hesitou por um momento, então disse em um tom neutro:

“Na verdade… Fiquei bastante tocado pelo seu discurso. Tudo o que você disse é verdade — essas crianças são de fato nosso futuro. Então, estava me perguntando se há uma posição de instrutor aberta na Academia. Estou bastante ocupado cuidando do meu território e da Cidadela, é claro, mas acho que posso ficar na Academia por alguns meses. Aprender com um veterano experiente como eu deve beneficiar as crianças, não acha?”