Escravo das Sombras - Capítulo 1911

Capítulo 1911: Caos Indomável

Morgan olhou para a antiga fortaleza abaixo dela. Os Cavaleiros de Valor e os guerreiros do Clã Dagonet estavam se preparando para a batalha — eles haviam protegido o rio por décadas, não deixando que uma única abominação do Tempestmar chegasse ao Lago do Espelho.

É claro que os melhores deles estavam em Godgrave agora… e o convidado que havia vindo do mar desta vez era uma criatura muito mais terrível do que os moradores abomináveis das profundezas.

Ela estremeceu.

O rio passava pela série de grandes eclusas e fluía para o sul, desaparecendo além do horizonte. O Tempestmar estava em algum lugar por lá, também, a alguns dias de distância.

Na verdade, Morgan não precisava destruir o Portão do Rio…

Porque ele já estava condenado.

Os guerreiros lotando as paredes da fortaleza não sabiam disso, e os seis Santos que ela havia recrutado também não sabiam. Mas, na verdade, não havia como parar seu irmão aqui. Ele destruiria o Portão do Rio sozinho — tudo, exceto o Portal — e libertaria o rio engaiolado, apagando todos os sinais da batalha destrutiva.

Os guerreiros morreriam. Os civis que viviam na jovem cidade que havia crescido rio acima do Portão do Rio provavelmente se tornariam danos colaterais no confronto Transcendente.

O objetivo de Morgan aqui não era salvar a casa ancestral do clã Dagonet, mas avaliar a força do inimigo e, esperançosamente, destruir alguns de seus vasos Transcendentes.

Ainda assim, ainda assim…

Lutar uma batalha perdida não parecia agradável.

Morgan havia herdado a linhagem do Deus da Guerra, e, portanto, muitas vezes era chamada de Princesa da Guerra. Ela estava lutando contra Criaturas do Pesadelo desde antes de Despertar — na verdade, Morgan mal havia terminado o ensino médio quando foi enviada para uma arena para enfrentar uma Besta Dormente pela primeira vez.

Seu Primeiro Pesadelo havia sido implacável, e ela havia passado pelo julgamento do solstício de inverno como qualquer Sonâmbulo comum passaria. Como Desperta, ela liderou incontáveis guerreiros em batalhas para proteger as terras controladas por seu pai, bem como várias cidades no mundo desperto.

Ela conquistou o Segundo Pesadelo sem perder um único membro de sua coorte, e se destacou em todas as funções confiadas a ela como Mestre…

Até a Antártica.

Nos quatro anos seguintes, a fama de Morgan só cresceu. Ela desafiou sozinha o Terceiro Pesadelo, atingiu a Transcendência, e tomou seu lugar de direito como general do exército Valor.

Estrela Mutável pode ter brilhado mais no campo de batalha, mas foi Morgan quem governou a poderosa máquina de guerra do Domínio da Espada, garantindo que o reino florescente não sofresse contratempos.

Hoje, muitas pessoas a chamavam de estrategista genial…

Claro, a maioria dessas pessoas não fazia ideia do que essa palavra realmente significava.

Na verdade, não havia estratégia em uma guerra de Despertos.

Havia apenas caos.

Em um campo de batalha onde Santos e Demônios lutavam, o caos reinava supremo. Havia muitos Aspectos estranhos, muitos poderes bizarros, muitas variáveis inconcebíveis. A maioria das lições ensinadas pela história da guerra iam por água abaixo, deixando apenas caos e carnificina em seu rastro.

Assim, a única coisa que um estrategista podia fazer era controlar o caos, domá-lo e fazê-lo servir seus objetivos.

…Veja o Portão do Rio, por exemplo.

Era uma fortaleza poderosa — uma que deveria ter sido quase inexpugnável para qualquer inimigo vindo do sul.

Mas o que importava se o inimigo possuía a Habilidade de conectar dois reflexos através de seu pequeno Reino do Espelho pessoal e viajar entre eles, trazendo seu exército junto?

Os guerreiros nas muralhas estavam se preparando para repelir um ataque do sul, as armas de cerco estavam apontadas rio abaixo, e até mesmo Morgan estava olhando para lá. Mas seu irmão podia facilmente atacar do norte, tomando a cidade atrás da fortaleza como refém primeiro.

Na verdade, ele podia simplesmente contornar o Portão do Rio totalmente e ir direto para o Bastião.

Somente ele não faria.

Porque Morgan estava aqui, domando o caos.

O objetivo de Mordret era o Bastião, mas ele não sabia que armadilhas seu pai e o Clã Valor haviam preparado para ele lá. Então, ele não o atacaria imprudentemente — conquistar a Grande Cidadela era uma tarefa que consumia tempo.

E se ele deixasse Morgan para trás e avançasse para o norte…

Ela simplesmente iria para o sul e tomaria o Jardim Noturno, em vez disso.

Essa era também a razão pela qual Mordret não podia espalhar seus vasos e atacar as cidades do Domínio da Espada situadas mais para o interior — ele teria que abrir mão das Cidadelas do Mar das Tempestades para estabelecer novas âncoras, e a antiga Grande Cidadela da Casa da Noite ficaria indefesa.

…É claro, Morgan tinha certeza de que seu irmão na verdade queria que ela atacasse o Jardim Noturno. Caso contrário, ele não teria encalhado aquilo ali, transformando-o em uma isca quase irresistível. Quem sabe que tipo de armadilha ele havia preparado para ela lá?

Afinal, Mordret — aquela coisa que fingia ser seu irmão — era um herdeiro da Guerra, também, não importava o quanto seu pai quisesse negar.

Mordret sabia como domar o caos, também.

Entre os dois, quem pudesse fazer isso melhor sobreviveria, e o outro morreria.

‘Engraçado.’

Morgan sorriu, aproveitando a brisa morna.

Ela realmente não tinha memórias de seu irmão da infância. Ele já havia partido quando ela cresceu o suficiente para se lembrar de qualquer coisa. A mãe de Morgan havia morrido ao dar à luz a ela, e seu pai era uma presença distante no melhor das hipóteses — ele era mais um professor do que um pai, cheio de expectativas exigentes, mas desprovido de calor.

Ela foi criada principalmente pelos anciãos do Clã Valor. Mas havia uma distância entre ela e os membros das famílias ramos, assim como as crianças dos clãs vassalos. Crescendo, a coisa mais próxima que ela tinha de amigos da sua idade eram as filhas de Ki Song… que agora eram suas inimigas, ironicamente.

Ainda assim, não havia sido uma infância infeliz.

…Até o irmão que ela não se lembrava ter retornado.

Morgan tinha dez ou onze anos quando ele apareceu no Bastião, já tendo conquistado o Primeiro Pesadelo. Ela estava feliz no começo, mas então… então, ela rapidamente aprendeu que havia algo errado com o garoto estranho que se intitulava Mordret.

Mordret havia ensinado a ela o que era medo, desde aquela época.

E agora, de pé na parede do Portão do Rio, Morgan sentiu isso novamente.

Ela odiava admitir, mas estava um pouco assustada.

Um sorriso divertido apareceu em seu rosto.

‘Como é refrescante.’

Era uma emoção tão nostálgica. Ela não a sentia há muito, muito tempo.

Virando-se para seus seis companheiros Transcendentes, Morgan hesitou por um momento, e então disse:

“O que estão esperando? Ao trabalho.”

Rouxinol lançou a ela um olhar confuso.

…Mesmo sua confusão parecia elegante e encantadora.

Ele era tão irritante.

“Que trabalho?”

Morgan ergueu uma sobrancelha.

“O que você quer dizer? Ordene aos soldados que recuem, tire-os das muralhas, comece a evacuar a cidade. Coloquem todos nos barcos e mandem-nos rio acima, para o Bastião.”

O Portão do Rio pode estar condenado, mas isso não significava que todos aqui tinham que morrer ou se tornar reféns do Príncipe do Nada. Embora houvesse algum valor estratégico em usar a guarnição como bucha de canhão para atrasar seus vasos, Morgan decidiu ignorar o caminho mais racional desta vez.

Ela balançou a cabeça.

“Parem de olhar e comecem a se mexer. Vão! Eu quero a cidade vazia até a noite…”