Capítulo 439: Ava: Magia da Alma

Os passos do Magíster Orion ecoam contra o chão da minha cabana enquanto ele me circula pela décima vez. O som combina com o palpitar de ansiedade em meu peito. Cada vez que ele passa atrás de mim, meus ombros se tensionam.

“Por favor, permaneça imóvel.” Sua voz grave carrega notas de concentração.

Uma brisa quente faz cócegas no meu couro cabeludo enquanto ele coloca a mão perto da minha cabeça novamente. A sensação me lembra de dias quentes de verão passados ao sol—agradável, mas nada notável.

“Me desculpe, mas tenho que tentar mais uma vez.”

Minhas pernas coçam de ficar tão parada. “Não tenha pressa.”

O cenho dele se aprofunda a cada volta. As rugas em torno dos olhos dele se tornam mais pronunciadas enquanto ele franze a testa, como se tentasse ver através da neblina.

“Não consigo detectar o que você está descrevendo.” Ele abaixa a mão. “A habilidade de inspecionar uma alma não é uma magia que usamos entre os Fae. Não sinto nada de incomum em você.” Ele acrescenta apressadamente, “Não estou duvidando da sua palavra. Seja lá qual for essa magia, está além da minha compreensão. Fora do meu alcance.”

Droga. Com a obsessão do Magíster por ler tudo relacionado à magia, eu tinha esperanças… “Entendi. Obrigada.”

A expressão do Magíster Orion se suaviza. “Isso apenas significa que precisamos de uma abordagem diferente. A Irmã Miriam talvez tenha melhores respostas para você.”

Meus ombros caem ao ouvir o nome dela. “Não tenho notícias dela há meses. Não sei nem se ela está bem.”

“Ah.” Ele acaricia o queixo, seus olhos azul-negros em movimento ficam distantes. “Atualmente, é provavelmente perigoso para ela tentar contato fora da Nova Ordem.”

Ela está viva. Meu coração bate forte; embora ela não esteja em minha mente todos os dias, estou preocupada com ela há bastante tempo. “Por quê?”

Seu olhar se fixa no meu, depois se desvia enquanto ele caminha em direção ao sofá para se sentar. “A Irmã Miriam conseguiu um lugar no seio da Nova Ordem. O custo foi… significativo.”

É incomum para ele ter uma linguagem corporal tão evasiva. Os cantos dos meus lábios se puxam para baixo antes que eu possa impedir.

Grimório murmura, Ela provavelmente teve que sacrificar aliados. É compreensível que ela não arriscaria o contato com aqueles que quer manter seguros, então.

Sua opinião é como um choque indesejado na minha cabeça. Sacrificar seus aliados? Ela não faria isso.

Grimório fica em silêncio em resposta, mas Selene não tem tais escrúpulos. Um dhampiro não é como nós, Ava. O favor deles é volúvel.

Sacudo a cabeça. A acusação não parece certa para mim. A Irmã Miriam pode ser enigmática e estranha, mas ela não parece ser do tipo que sacrifica os outros. Ela nos ajudou tantas vezes, exigindo pouco ou nada em troca. “O que você quer dizer com custo, Magíster?”

Seu imenso corpo se remexe no meu sofá, que range sob o seu peso. Uma mão cansada gesticula pelo ar. “Essa é uma história para outro dia, criança.”

“Mas—”

“Eu tenho contatos entre as comunidades de vampiros.” Ele corta meu protesto para mudar de assunto. “Embora nenhum que eu confiaria com seus segredos. Por enquanto, devemos esperar pela própria Irmã Miriam.”

O resmungo do Grimório ecoa em minha mente. O som me lembra de trovões rolando por montanhas distantes.

Por que você não sai e fala com ele diretamente? Eu pergunto ao Grimório. Entre os dois, talvez vocês consigam descobrir alguma coisa. Afinal, ambos são mestres da teoria.

Não tenho interesse em me tornar seu próximo campo obsessivo de pesquisa. O tom do Grimório pinga de desprezo. Você viu como os olhos dele brilham ao mero mencionar de novos conhecimentos mágicos? Eu o vi em suas memórias. Não, obrigado.

A imagem mental do Magíster Orion curvado sobre a forma de livro do Grimório, rabiscando notas com excitação febril, é o suficiente para entender o ponto de vista dele.

Selene descansa sua cabeça na perna do Magíster, permitindo-o acariciar sua cabeça e orelhas enquanto ela se senta na frente dele.

Os dedos do Magíster Orion traçam o contorno das orelhas de Selene. “Fascinante. Um espírito de lobo residindo na forma de um husky. Como isso é possível?”

“Seu palpite é tão bom quanto o meu.” Meus ombros se levantam em um encolher de ombros meio sem vontade. “Paramos de tentar entender isso há meses.” Uma pontada de culpa me perfura o peito ao acrescentar, “As memórias dela também desapareceram. Não todas, mas muitas.”

Os olhos giratórios dele se estreitam enquanto ele aperta as orelhas de Selene juntas, depois as solta. Ela nem mesmo treme com o contato, contente em desfrutar de sua atenção. “Desaparecidas, você diz? Eu me pergunto.” Sua forma maciça se inclina para a frente, fazendo meu pobre sofá protestar. “A sua companheira tem acesso à alma dela? Talvez ela tenha proteções similares.”

Grimório? Eu direciono a pergunta interiormente, onde sua presença queima como um fogo amortecido. Você pode verificar?

A resposta dele crepita com irritação. Meu vínculo é com você, não com ela. Não posso acessar a alma de Selene mais do que posso acessar a alma daquela árvore fora da sua janela.

A acidez no tom dele me faz estremecer. Ele tinha falado em descobrir o que aconteceu com as memórias dela, então eu tinha assumido—

A mente e as memórias dela não são o mesmo que a alma dela. Conectadas, mas não iguais. Uma alma vem com suas próprias proteções.

“Não faço ideia,” eu digo ao Magíster Orion sinceramente.

Os dedos do Magíster Orion param nas orelhas de Selene. “Suas almas estão conectadas, mas você sente uma e não a outra? Isso parece… peculiar.”

Meu coração salta; Grimório não quer que o Magíster Orion saiba de sua existência, mas ele é exatamente o motivo pelo qual sei essas informações. “Bem, eu—” O calor sobe pelo meu pescoço. “Eu tive um sonho sobre minha alma. Foi assim que soube das proteções.”

Doce, Grimório debocha. Muito convincente.

Cala a boca.

“Um sonho?” Os olhos giratórios do Magíster Orion se fixam no meu rosto; não há como ele não entender que estou mentindo. “Entendo.”

Eu pigarreio, desesperada para redirecionar sua atenção. “O que você sabe sobre proteções de alma em geral?”

“Ah.” O Magíster Orion balança a cabeça. “A magia da alma não é algo com que nós, Fae, nos envolvemos. A alma é sagrada—destinada a ser intocada, de domínio dos deuses.” Seus dedos retomam suas carícias suaves ao longo das orelhas de Selene. “Embora isso não tenha impedido alguns de tentar.”

“O que você quer dizer?”

“Sempre há aqueles que buscam conhecimento proibido.” Seus olhos giratórios escurecem para um preto puro. “Os obsessivos. Os desesperados. Aqueles que acreditam que podem dominar poderes além da compreensão mortal.”

Minha pele se arrepia. “Eles conseguiram?”

Seus lábios se apertam em uma linha fina, e ele finalmente se reclina, retirando a mão da cabeça de Selene. “Não sabemos. Suas pesquisas foram destruídas, seus nomes riscados da nossa história.”

“Mas alguns sobreviveram?”

“Em segredo, é provável. E há os vampiros. Eles entendem mais sobre a alma do que qualquer outra raça. A existência deles depende disso—a transferência de força vital, a manipulação da própria morte. Mas eles não compartilham essas informações com outros. Afinal, essa é a sua fraqueza.”