408: Ava: Confortante 408: Ava: Confortante Claro, eu não consigo dormir.

Minha ansiedade venceu meu esgotamento, e eu continuava acordando sobressaltada a cada vinte minutos. As olheiras embaixo dos meus olhos estão tão acentuadas que eu talvez tenha de me identificar como uma transformista guaxinim.

Não está tão ruim assim. Selene cutuca minha mão com seu focinho frio.

“Está sim, mas obrigada por mentir para mim.” Esfregando suas orelhas, sigo em direção ao hospital. Ou tento.

O corpo peludo de Selene me bloqueia, e um dos meus guarda-costas realmente me agarra pelos ombros e me vira na direção da cantina. Eu posso sentir o cheiro de ovos e algo que cheira suspeitosamente a bacon. Novamente, meu olfato não é tão bom quanto o de outros transformistas—mas é muito melhor do que um nariz humano padrão.

“Quero visitar Ivy,” eu protesto, mesmo sentindo meu estômago roncar.

“Ordens do Alfa. Ele disse que você precisa de refeições regulares.”

Os cabelos loiros do jovem guarda estão espetados em todas as direções, como se ele tivesse acabado de sair da cama. Seus olhos castanhos e suaves perambulam por aí, procurando por ameaças enquanto evitam o meu olhar propositalmente. Hmm. Ele é esperto. Provavelmente sabe que vou tentar convencê-lo a me deixar checar Ivy primeiro.

É muito mais difícil fazer pressão em alguém que se recusa a olhar no seu rosto.

“Você é novo.” Cruzo os braços, analisando-o. “Qual é o seu nome?”

“Brett, Luna.” Sua voz sai estável, mas seus ombros ficam tensos. Ele sabe o que está vindo.

“Bem, Brett, eu aprecio sua dedicação, mas—”
“Ordens do Alfa são claras.” Seu tom permanece firme. “Café da manhã primeiro.”

Meu estômago me trai com outro ronco alto. O cheiro de bacon fica mais forte, fazendo minha boca salivar apesar dos meus protestos.

Nosso companheiro cuida bem de nós, Selene se pavoneia, abanando o rabo. Ele sabe que você pularia as refeições de outra forma.

Ah é? Grimório entra na conversa mental do nada. Que interessante. Não era você que detestava Lucas, Selene? Algo sobre ele ser um arrogante, controlador, estúpido—
Isso foi antes, Selene o interrompe com um estalo de seus dentes. Ava o escolheu. Ele se provou digno.

Eles já estão em plena forma hoje.

“Onde estão Marcus e Greg?” Ignorando a leve discussão entre eles, direciono minha atenção ao guarda na minha frente. Há outros, claro, mas a uma distância.

“Eles voltarão para o turno esta noite, Luna.”

Uma resposta insatisfatória. Eu posso conversar com Marcus. Ele entenderia meu desejo de checar Ivy antes de ir para o café da manhã. Um atraso de quinze minutos em devorar um prato ou dois de comida não vai me machucar, afinal de contas.

Mas esse cara Brett parece devotado a seguir a risca as demandas de Lucas.

Um grunhido mal-humorado escapa antes que eu possa pará-lo. “Brett. Como Luna, eu preciso checar nossa estimada convidada. A saúde dela é uma prioridade.”

“Como seu guarda, eu preciso garantir que nossa estimada Luna tome café da manhã. As ordens do Alfa são minha prioridade.” O tom suave de Brett leva um toque de humor. “Além do mais, Vanessa ameaçou me sedar se eu deixasse você pular uma refeição.”

Droga. Até ela está nessa. “Você não deveria admitir as ameaças.” Meus lábios tremem. “Isso arruina a imagem do guarda estoico.”

“Acho que honestidade pode funcionar melhor que estoicismo.” Ele dá de ombros, ainda sem me encarar.

Onde Lucas encontrou esse? Provavelmente mexeu pelo bando até poder encontrar alguém que não seria convencido a afrouxar os limites de suas ordens, droga.

“Tudo bem.” Estreito meus olhos. Eles podem ser capazes de me impedir de ir pro quarto da Ivy, mas há mais de uma forma de despelar um lobo. “Agora pergunte a Vanessa como ela está.”

O rosto de Brett relaxa, seus olhos desfocados. O sinal revelador de comunicação mental. Eu bato o pé, esperando por seu relatório sobre a condição da Ivy.

“A Curandeira Vanessa parece bem, Luna, apesar de ter estalado comigo por interromper suas rondas.”

“Não é—” Minhas mãos se fecham. “Eu quero saber como Ivy está, não Vanessa.”

É preciso ser claro e conciso ao dar ordens, Grimório aponta. Ele parece entretido.

É só um jovem filhote, Selene diz, quase interrompendo-o. Ainda está aprendendo.

Meu olho treme. Por que vocês dois estão agindo como se eu tivesse acabado de esfolar ele vivo?

O rabo de Selene balança lentamente. Você fica um pouco irritadiça sem dormir direito.

“Eu não fico!”

O cujo está correto. Você tende a ficar irritadiça quando está cansada.

Brett, dando crédito a ele, não diz nada enquanto continua me guiando para a cantina.

O cheiro familiar da comida de Elverly enche meu nariz conforme empurro as portas duplas.

“Deixe seus malditos guardas do lado de fora! Não temos espaço para eles se enfiarem por aqui.” A voz de Elverly corta o ar como um chicote.

Olho para trás, mas ninguém me seguiu para dentro.

A estação de serviço chama, e eu ando em direção a ela, pronta para encher um prato.

“Sente-se!” Outro comando afiado do chef gnomo, que nem sequer olhou pra mim.

Meus pés me levam à mesa mais próxima antes que meu cérebro se dê conta. Momentos depois, Elverly aparece ao meu cotovelo, despejando um prato cheio de ovos, bacon e o que parece ser biscoitos frescos.

“Você está com uma cara péssima.”

Um sorriso puxa meus lábios. Há algo estranhamente tocante em sua preocupação áspera. “Não dormi bem.”

Ela resmunga, se afastando apenas para voltar com uma caneca fumegante de chá que ela coloca ao lado do meu prato. Brett repentinamente materializa-se ao meu cotovelo.

“A condição da paciente continua estável, Luna. Sem mudanças desde a noite passada.” O relatório de Brett alivia um pouco da tensão nos meus ombros. Pelo menos ela não está piorando.

“Eu gaguejei?” Elverly rosna, com as mãos na cintura enquanto o examina. “Não ter guardas dentro significa não ter guardas dentro!”

Os olhos de Brett se arregalam enquanto ele levanta as mãos. O gnomo é infame por todo Wolf’s Landing, e pouquíssimas pessoas têm a coragem de confrontá-la. “Minhas desculpas, senhora.” Ele recua em direção à porta, de alguma forma sem tropeçar em nada. “Esperarei lá fora.”

“Bom.” O aceno afiado de Elverly o segue para fora. “Esses lobos pensam que eles podem fazer o que quiserem na minha cozinha.”

O cheiro de biscoitos frescos traz minha atenção de volta ao prato. O vapor sobe dos ovos mexidos perfeitos, e o bacon parece crocante, exatamente como eu gosto. Meu estômago ronca novamente, mais alto dessa vez.

Viu? Comida é importante. A voz mental de Selene carrega um tom de satisfação.

Pego meu garfo, escondendo meu sorriso. Há algo reconfortante na natureza rabugenta de Elverly. Ela trata todos da mesma forma—até mesmo Lucas é repreendido às vezes. Uma vez porque ele derramou seu café no chão que ela acabara de limpar.

A primeira mordida nos ovos derrete na minha boca. Como ela consegue fazer algo tão simples como ovos mexidos ter esse gosto tão bom?

Magia, Selene sugere.

Na verdade, é técnica, Grimório corrige. A chave está no—
“Era uma pergunta retórica,” eu murmuro com a boca cheia de ovos.

“Pare de enrolar e coma.” Elverly aparece outra vez, desta vez com um pote de mel para meu chá. “Você está magra demais.”

O cuidado dela, relutantemente amoroso, de alguma forma tem a habilidade de derreter a ansiedade que pesava em mim durante toda a noite, e eu bebo o chá alternando com engolir a comida em um ritmo indecente.

Algo está estranho, Grimório diz, enquanto todo encantamento que eu coloquei subitamente dispara alarmes.