Capítulo 314: Luz do sol
Ele virou ligeiramente o torso, revelando suas costas — escorregadias de sangue e pontilhadas com uma grotesca fileira de pequenos portos, ainda brilhantes com o resíduo de injeções.
“Ordene ao cientista que me dê os últimos frascos,” ele disse, a voz baixa e pesada de finalidade. “Tudo. Cada gota. Então, e somente então, você me terá — completamente. Sem mais fragmentos. Sem mais Hades. Apenas eu. Vassir, seu primeiro amor.”
Meu coração parou.
Ele estava pedindo para eu matá-lo.
Para apagar Hades — para sempre.
E eu vi isso em seus olhos.
Ele falava sério.
Ele queria o último vestígio de Hades queimado.
Por mim.
Ou—
Ele levantou Kael mais alto.
A asa ficou tensa.
Suas garras se estenderam.
“Não,” eu ofeguei. “Não — não se atreva —”
“Escolha.” Vassir rosnou. “Prove sua lealdade. Ou perca a única coisa que ainda ousa se colocar entre nós.”
Kael fez um único som — meio engasgo, meio rosnado. Seus olhos encontraram os meus.
E neles, eu vi paz.
Resignação.
Amor.
Lágrimas caíram dos meus olhos, incontroláveis.
Virei-me para o cientista despedaçado que tremia no chão, agarrando uma seringa meio amassada.
“Não.” Eu murmurei. Supliquei.
Mas Vassir viu.
E seu rosto ficou frio.
“Eu te avisei.”
E então—
Com um único estalo nauseante —
Ele arrancou a cabeça de Kael do corpo.
Sangue cortou o ar como um halo, pintando o laboratório de carmesim. Seu corpo desabou no chão com um baque úmido e sem vida.
Um grito rasgou da minha garganta.
Mas não aconteceu.
O sangue nunca veio.
A cabeça de Kael nunca caiu.
Porque não era real.
Era uma visão.
Um flash.
Uma promessa envenenada do que aconteceria.
E isso me quebrou.
Eu ofeguei, cambaleando para trás, agarrando o ar como se pudesse arrancar o horror da minha mente. Meu coração batia contra minhas costelas como se estivesse tentando escapar do meu peito.
Não era real.
Ainda não.
Mas seria se eu não agisse.
Kael cedeu no aperto da asa, inconsciente agora — seu pulso oscilando tão fracamente que quase pensei que tinha desaparecido. Seu corpo oscilava com cada respiração de Vassir, mole, frágil, indefeso.
Eu não podia fazer isso.
Eu não podia deixar Kael morrer por Hades.
Eu não podia.
Minhas mãos tremiam quando me virei para o cientista trêmulo, que me olhava com olhos selvagens. Os frascos restantes tremiam em uma bandeja ao lado dele.
“Sinto muito,” eu sussurrei.
Então, mais alto, mais firme — “Faça isso.”
O homem se encolheu. “Eu — ele vai me matar —”
“Eu sei,” eu soluçava. “Apenas — faça isso.”
Quando ele não se moveu, caí de joelhos e agarrei a seringa eu mesma.
Ela escorregou em minhas mãos.
Minhas mãos estavam escorregadias.
De sangue ou lágrimas — eu não sabia.
No momento em que toquei a agulha, tudo em mim gritou.
Visões correram por mim como uma enchente rompendo uma represa.
Hades no Gala Lunar, sua mão na pequena das minhas costas enquanto dançávamos em um círculo de estrelas.
Sua voz no ringue enquanto me treinava, uma mão no meu quadril, guiando. Corrigindo. Provocando.
Seus lábios pressionados aos meus no escuro. Sua risada ressoando contra minha pele.
Ele me segurando.
Beijando minhas cicatrizes.
Me marcando.
Co—co—
Eu quebrei.
“Eu te amo,” eu sussurrei, a voz quase inaudível enquanto a agulha tremia entre meus dedos.
Então eu empurrei.
Um.
Depois outro.
A seringa chiou enquanto esvaziava em sua pele.
Ele estremeceu.
Suas asas tremeram.
E os últimos fragmentos de Hades começaram a desaparecer — apagados pelas minhas próprias mãos.
Porque eu não podia deixar Kael morrer.
Porque eu não podia perder os dois.
E assim—
Eu escolhi.
Mesmo enquanto isso me rasgava por dentro.
Vassir riu.
Riu como se fosse um êxtase — como se meu sofrimento fosse uma sinfonia que ele esperou séculos para conduzir.
Com um movimento de suas asas, ele soltou Kael.
O corpo caiu com um baque nauseante.
Eu me joguei para frente com um grito, a seringa ainda apertada no punho.
Mas não fui rápida o suficiente.
Kael bateu no chão em um amontoado de membros, seu pescoço em um ângulo antinatural, seu pulso mal ali.
“Não, não, não—” eu soluçava, rastejando até ele, embalando sua cabeça em meu colo. “Me desculpe. Sinto muito…”
Vassir pairava acima de nós, as costas arqueadas com tremores de prazer enquanto as injeções criavam raízes. Suas veias pulsavam com negro derretido, se espalhando pelo peito como um parasita livre das amarras.
“Você fez isso,” ele sussurrou, sua voz agora duplicada—dois tons, sobrepostos. “Você escolheu.”
Eu queria gritar.
Eu queria morrer.
Mas tudo o que eu podia fazer era segurar Kael.
O segundo frasco sibilou vazio.
Então o terceiro.
Eu perfurei o quarto na carne queimada no ombro de Vassir.
Ele grunhiu, asas se debatendo violentamente.
Com cada injeção, ele mudava.
Ossos estalaram. Pele se esticou. Os últimos vestígios da forma de Hades se dobravam sob a corrupção enrolada ao redor dele como hera feita de podridão.
> “Volte para mim,” eu implorei entre lágrimas. “Hades, por favor. Se algo restar… lute.”
Mas não houve resposta.
Nenhum piscar em seus olhos.
Apenas Vassir—extasiado.
Faminto.
Reivindicando a carne para si mesmo.
Eu perfurei a próxima. E a seguinte. Minha visão nadava.
Até o décimo segundo frasco, eu estava gritando. Soluçando. Minhas mãos cobertas de seu sangue.
O décimo terceiro estilhaçou em meu aperto.
O décimo quarto deslizou como rendição.
O último tremia em minha palma.
> “É isso,” Rhea sussurrou em minha mente, tremendo. Ela mal conseguia falar.
Eu não hesitei.
Porque Kael morreria se eu não o fizesse.
E eu não podia deixar isso acontecer.
Mesmo que significasse perder Hades.
Para sempre.
Então eu o finquei.
O décimo quinto frasco clicou.
Sibilou.
E esvaziou nele.
O corpo de Vassir convulsionou—arco para trás, boca aberta em um rugido silencioso. Asas se abriram largas, tremendo com luz sobrenatural.
Então—
Imobilidade.
Eu me afastei dele. Desmoronei ao lado de Kael.
Segurei sua cabeça contra meu peito, minha mão pressionada ao seu esterno.
Batida.
Batida.
Tão fraca.
Mas lá.
A porta atrás de nós explodiu com um estrondo.
Botas invadiram. Dezenas.
Armas sacadas.
Capacetes colocados.
Seus olhos fixos no monstro que estava onde Hades costumava estar.
Na frente—
Montegue
Rosto sombrio.
Armadura negra como o vazio.
Uma arma pendurada no ombro—cano longo, entalhada com runas, brilhando com carga.
“Fiquem parados,” ele gritou. “AGORA!”
Mas Vassir apenas sorriu.
O último das injeções ainda pingando de sua coluna.
Ele virou—
E abriu suas asas.
Montegue não hesitou.
“Eve—abaixe-se!”
Meu corpo caiu por instinto.
Um estrondo ensurdecedor cortou o ar, do tipo que faz seus dentes doerem. Não em Vassir. Não em mim. Mas no teto—bem acima dele.
O projétil com runas acertou com força cirúrgica. Pedra, aço e isolamento explodiram, chovendo em pedaços como se um deus tivesse lançado uma lança através dos céus.
Por um breve instante, Vassir apenas piscou, confuso.
Então ele gritou.
A luz entrou.
Não luz da lua. Não eletricidade.
Luz do sol.
Brilhante. Purificadora. Impiedosa.
Ela atravessou o teto destruído como uma lâmina de cima, perfurando as sombras que se agarravam a ele como uma segunda pele. Suas asas chiaram de imediato, se enrolando como papel na chama.
“NÃO!”
A voz que saiu dele não era nem de Hades nem de Vassir sozinha—era algo mais antigo, uivando em agonia.
Sua pele se empolou. Rachou.
Vapor saiu de cada ferida.
Ele tentou saltar para trás nas sombras, mas Montegue já estava lá, levantando a arma novamente. Mais guardas invadiram os corredores laterais, invadindo salas adjacentes e atirando nas paredes internas.
Cada disparo era direcionado—não nele, mas na estrutura.
Mais luz do sol. Mais calor.
Vassir cambaleou.
Suas asas fraquejaram, membros travando sob o calor. Ele cambaleou em direção ao corredor, mas um grupo de guardas Obsidian já o haviam circulado por trás. Balas envoltas em prata refletiva e cinzas abençoadas bombardeavam as paredes ao redor dele, ricocheteando luz em todas as direções.
Não havia onde se esconder.
Nenhuma sombra profunda o suficiente.
Ele tentou mudar, se desfazer, desaparecer—mas a luz o prendeu como correntes. E ainda assim, eu segurava Kael, soluçando, seu coração batendo fraco sob minhas palmas.
“Você deveria ter ficado morto,” Montegue murmurou, sua arma firme. “Este reino não pertence mais a você.”
E ele atirou novamente.
Direto no coração do monstro que usava o rosto do meu marido.