Capítulo 301: Elysia
Eve
Dor transformada em fúria, antes que pudesse ser dissipada.
A voz de Rhea cortou o vazio, baixa e fervente:
> “Queime o amor e destrua-o, Elysia. Você já fez isso antes.”
Elysia.
O nome acertou como um raio. Não Eve. Não Vermelho.
Elysia. Mãe o
E então…
Flashs.
Rápido demais. Cru demais.
Uma mulher.
Cabelos como fogo selvagem, eram longos, soltos, chicoteando em um vento violento. Seus olhos estavam sombreados. Um vestido medieval grudado em seu corpo ensanguentado, rasgado nas costuras enquanto ela caía de joelhos.
Ela gritou, enquanto seus ossos estalavam e se remodelavam, pele se estendendo em pelo tão escuro que absorvia a luz. Sua forma se contorceu num lobo como nenhum outro, enorme, antigo e coroado de sombra.
Ela rosnou para uma forma. Uma figura.
Envolto em preto. Sem rosto. Apenas chifres—retorcidos, curvados, obsidianos e fumegantes.
Uma segunda sombra surgiu acima da primeira. Esta era familiar, traição floresceu em meu peito.
Ela desceu do vazio, sem rosto, mas coroada com uma coroa de prata murcha.
Sua mão—massiva, pálida, veined com luz—desceu e agarrou o chifre da figura abaixo.
E a mulher de cabelo vermelho gritou,
“Malrik!”
Estalo.
O chifre quebrou na mão da figura iluminada pela luz das estrelas.
A entidade envolta em manto soltou um grito horrível, divisor de átomos. O tipo de som que precede uma catástrofe. Que cria uma.
Eu ofeguei—e acordei dentro do pesadelo novamente.
Hades.
Em cima de mim. Seu peso, sua respiração, seus olhos—
Ainda dentro da minha mente, desfiando-a.
Mas agora—eu estava queimando. Não por causa dele.
Por minha causa.
“Você não pode me reescrever,” engasguei. “Você não pode decidir quem eu sou—”
Eu alcancei—
E agarrei seu chifre.
Ele queimou sob minha palma. Ardente. Gritante. Seu corpo se sacudiu como se golpeado.
> “Não,” ele rosnou. “Você pertence a mim.”
E eu entortei.
Com tudo que eu tinha. Meu corpo tremeu. Meus músculos rasgaram.
Mas o chifre rachou.
Seus olhos se arregalaram—apenas por um momento. O medo rompeu através da névoa do Fluxo.
E então—ESTALO.
O som foi bíblico. Um aviso de morte. Um começo.
Hades uivou—uma coisa miserável, borbulhante, desencarnada. Como se sua alma tivesse sido separada de seu corpo.
Ele rasgou o reino dos sonhos como um terremoto sonoro negro.
Usando o choque, eu pressionei meus joelhos em seu estômago e chutei.
Ele voou para trás—bateu na parede com um estalo doentio que fez rachaduras se espalharem como gelo em vidro.
Eu me transformei.
Minha pele rachou. Meus ossos gritaram. Meu lobo irrompeu, maior do que jamais a conheci. Ela aterrissou, garras cavando na pedra, olhos brilhando com vingança.
Pelo negro cintilava. Não apenas negro quase vazio.
Suas presas brilhavam. Seus lábios se curvaram.
Rhea estava de volta.
E desta vez
Não estávamos fugindo.
Ele se levantou lentamente.
Tremendo.
Uma de suas mãos segurava o chifre quebrado—serrado na base, vazando ícor preto-vermelho. A outra tremia enquanto ele apoiava-a contra a parede fraturada para se equilibrar. Eu podia ouvir sua respiração—áspera, irregular, como se algo dentro dele tivesse se soltado.
Então ele olhou para mim.
E pela primeira vez, ele não rosnou.
Ele encarou.
Para mim.
Para o que eu havia me tornado—ligada à sombra, pelo escorrido de escuridão, olhos em brasas queimando nos dele.
Seus olhos que haviam sido ardentes e cruéis, estavam arregalados.
Com medo.
Rhea rosnou baixo em minha garganta, sua raiva fervendo logo abaixo da minha pele.
> “Deixe-me rasgá-lo.”
Mas eu mantinha. Assistia. O ar entre nós vibrava com violência, com desgosto, com o fio tênue entre fúria e contenção.
Então—
Ele caiu.
Desabou como se alguém tivesse cortado suas cordas.
Ele caiu de joelhos. O chifre quebrado caiu de sua mão, batendo no chão com um som que me fez se sobressaltar.
Suas garras se juntaram.
Aquelas asas terríveis—mutadas, corrompidas—caíram sem força atrás dele. Caídas e derrotadas.
E então, em uma voz que não era apenas dele—uma mais profunda, mais antiga, ecoando através do tutano e sombra—ele sussurrou,
> “Elysia… por favor, perdoe-me.”
O mundo parou.
Esse nome. Esse nome.
Não Vermelho. Não Eve.
Elysia.
Rhea ficou imóvel. Não desaparecida. Apenas… ouvindo. Como se algo antigo dentro de nós tivesse parado para se lembrar.
Ele olhou para mim. Lentamente. Quase reverentemente.
> “É você,” ele disse, voz quebrando.
Sem comando nela.
Sem fome.
Apenas assombro.
Apenas tristeza.
Ele se curvou mais baixo, garras arrastando contra pedra, um tremor correndo por ele como se pudesse se desintegrar.
> “Achei que os sonhos eram ecos,” ele sussurrou. “Fantasmas. Uma punição. Mas é você… Você é ela.”
Eu dei um passo à frente.
Garras raspando como trovão.
E eu não sabia—
Não sabia se queria matá-lo.
Ou perguntar o que diabos ele quis dizer.
Pisquei e aquelas profundezas ominosas de seus olhos se fecharam.
Ele recuou em uma única respiração.
Assim mesmo.
Sem resistência. Sem batalha.
A silhueta monstruosa desapareceu, deixando apenas o homem. Sem garras. Sem asas. Apenas Hades—ferido, despido, atordoado.
Ele se ergueu, cambaleando uma vez, olhos ainda fixos nos meus como se não pudesse acreditar que eu era real.
Eu também me transformei, deixando o pelo recuar, meus ossos voltando para o lugar com um estalo cruel, dor dançando na minha espinha como luz do fogo. Minhas respirações vinham ásperas, minhas mãos cerradas e tremendo.
Ele deu um passo em minha direção.
“Eu deveria ter lutado contra isso,” ele disse, voz rouca, desesperada. “Deveria ter sabido que era você, eu—”
Mas ele não terminou.
Porque eu o soquei.
Direto no queixo.
O som de osso contra osso ecoou como trovão, e ele recuou com um grunhido, olhos arregalados em choque—não pela dor, mas pela fúria por trás disso.
Lágrimas queimaram seu caminho pelas minhas bochechas.
“Você não pode dizer isso,” eu sibilei, minha voz quebrando a cada palavra. “Você não pode ver-me—agora—depois do que fez e achar que um pedido de desculpas é o suficiente.”
Ele não respondeu.
Não levantou a mão para tocar seu queixo onde já estava escurecendo com uma contusão.
“Eu te implorei,” eu sussurrei. “Eu chorei por você. Eu sangrei por você. E você ainda escolheu controle sobre a verdade. Você deixou o Fluxo me levar. Você deixou-o me desfazer.”
Dei um passo à frente.
E então a represa rompeu.
“Você tentou me possuir!” Eu gritei, o som rasgando minha garganta como vidro. “Você olhou dentro da minha alma, viu tudo—cada cicatriz, cada fratura—e ao invés de protegê-la, você a destroçou!”
Meu peito arfava. Meus punhos tremiam.
“Você tentou me reescrever, Hades. Como se eu fosse uma história de que você não gostasse do final. Como se eu fosse uma coisa. Uma posse. Uma maldita ferramenta!”
Ele estremeceu, lábios se entreabrindo—mas eu não parei.
“Você acha que nunca fizeram isso comigo antes? Todos que eu já amei tentaram me moldar no que queriam. Meus pais. James. Ellen. Felícia. Todos me viam como algo a ser usado.”
Eu bati minha palma contra meu peito, minha voz rachando. “E agora você. Você, que disse que me amava.”
Seu queixo cerrou. “Eu amo você.”
Eu ri. Afiada. Feia. Vazia.
“Então você deveria ter lutado contra o Fluxo,” eu cuspi.
“Eu deveria,” ele disse, baixo e arrependido. “Eu deveria ter lutado mais duro—”
“Não,” eu interrompi, me aproximando. “Não me diga isso.”
Ele olhou para mim, sobrancelha franzida. “O quê?”
“Você age como se fosse algo feito contra você. Como se fosse apenas uma vítima passiva.” Eu apontei um dedo em seu peito. “Mas você deixou entrar. Você o acolheu. Você pegou aquela coisa e a enterrou dentro de si como um covarde porque estava com medo demais para enfrentar o que realmente sentia.”
A garganta de Hades se mexeu como se ele quisesse argumentar, mas as palavras não saíam.
“Você não fez isso por causa do Fluxo,” eu ferveu de raiva. “Você fez isso com ele. Porque ficou mais fácil. Mais fácil ser cruel. Mais fácil me controlar. Você o usou como um apoio para fugir da culpa.”
Eu me aproximei ainda mais, baixando a voz. “Você acha que eu não sei como é isso? Ser esvaziado? Ter sua vontade tirada de você, fio por fio? Eu vivi isso. Eu sangrei por isso. E você—” minha voz quebrou, “—você escolheu se tornar a própria coisa que me quebrou.”
O silêncio pesou como uma guilhotina entre nós.
Então ele sussurrou, mal conseguindo falar, “O que eu deveria ter feito?”
Eu o encarei.
“Diga-me, Eve. O que você teria feito?”
Eu não respondi imediatamente.
Porque eu sabia.
E quando falei, minha voz estava calma—mas cortante como uma lâmina.
“Se algo dentro de mim alguma vez me tornasse um perigo para você…” Eu engoli com dificuldade. “Se algum deus sombrio, alguma maldição, algum veneno me fizesse perder a mim mesma… eu teria cortado minha própria garganta antes de tocar um dedo em você.”
Hades piscou.
O ar na sala mudou.
Seu rosto—tão ilegível momentos atrás—desmoronou. Rompeu.
E naquele sopro de silêncio entre nós, eu disse o que estava rastejando por baixo das minhas costelas por semanas:
“Mas parece que—mesmo depois de tudo—você não faria o mesmo por mim.”
Eu deixei a verdade se acomodar.
Minha voz tornou-se amarga.
“Então o que exatamente nos resta?”
Eu balancei a cabeça. “Porque se isso foi amor… então sempre foi unilateral.”
A boca de Hades se abriu—apenas ligeiramente.
Como se pretendesse protestar.
Ao tentar alcançar algo, qualquer coisa que ainda nos amarrasse ao que costumávamos ser.
Mas eu não deixei.
“Eu sei o que você vai dizer,” eu disse, voz baixa e firme, mas vazia nas bordas. “Você dirá que não foi de propósito. Que não foi você. Que o Fluxo te distorceu.”
Ele estremeceu—porque era verdade.
“Eu sei,” eu continuei, encarando-o diretamente, “você dirá que estava desesperado. Que estava com medo. Que estava tentando me proteger, ou Elliot, ou alguma versão do futuro que não suportava perder.”
Ele tentou se aproximar, mas eu dei meio passo para trás.
Não por medo.
Por finalização.
“Mas eu não sou a garota ingênua que você marcou com um símbolo de parceiro e trancou em uma cela, Hades,” eu sussurrei. “Não mais.”
Ele congelou.
Eu vi.
A quebra em sua expressão—a percepção de que algo em mim havia mudado de um jeito que não seria desfeito. Nem com o tempo. Nem com lágrimas.
Eu endireitei minha coluna e limpei uma lágrima da minha bochecha com o dorso da mão, esfregando cinzas e sangue e desilusão na minha pele como tinta de guerra.
“Haverá uma reunião do Conselho amanhã,” eu disse friamente.
Sua sobrancelha franzida. “Eve—”
“Eu tenho um anúncio.”
Minha voz agora era aço. Endurecida no fogo que ele acendeu e depois me deixou queimar nele.
Hades deu mais um passo à frente, pânico permeando sua voz agora. “Eve, não—”
“Não o quê?” Eu interrompi, olhos afiados como vidro quebrado. “Não recuperar minha vida? Não parar de ser sua sombra? Não lembrar ao mundo que eu nunca fui apenas sua parceira—sempre fui mais?”
Ele ficou em silêncio.
Eu me virei para sair, meu corpo dolorido, garganta áspera.
Mas pouco antes de abrir a porta, olhei para trás—apenas uma vez.
E eu disse isso não com malícia.
Nem mesmo ódio.
Apenas a verdade.
“O que quer que ainda reste entre nós… não pode sobreviver ao que você fez.”
Então eu saí.
E desta vez—
Ele não me seguiu.